quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

O CONTRA BAIXO

Os ancestrais ou parentes mais próximos de vários dos instrumentos musicais de hoje podem ser traçados com certa precisão. Já para os instrumentos de arco, como o violino ou o violoncelo, são muitas as dificuldades em se estabelecer quando eles apareceram. O contrabaixo e outros instrumentos com este tipo de função também se encontram neste caso.
As origens do contrabaixo remontam à cinzenta Idade Média. Descendente de uma família chamada “Violas” e que se dividia em dois grupos: violas de braço e violas de perna, o contrabaixo é hoje o herdeiro maior e de som mais grave deste segundo grupo. Porém, o caminho que foi percorrido para se chegar até a ele nem sempre é fácil e seguro de ser traçado. Por volta do ano 1200, o nome Gige era usado para denominar tanto a rabeca (instrumento de origem árabe com formato parecido com o alaúde) como o “Guitar-fiddle” (espécie de violão com formato parecido com o do violino).
Na Alemanha, naquela época, quase todos os instrumentos tocados com arco eram chamados pelo nome de Gige. Havia o pequeno Gige e o grande Gige. A música que era executada nesta época era bastante simples. As composições situavam-se dentro de um registro bastante limitado e, no que tange a harmonia, as partes restringiam-se a dois ou três vozes. Era muito comuns instrumentos e vozes dobrarem as partes em uníssono.
Com o desenvolvimento de novos estudos harmônicos, o número de partes foi se expandindo para quatro. Em 1450, aproximadamente, começou-se a usar o registro de baixo, que até então não era considerado. Com esta nova tendência para os registros mais graves, os músicos precisavam de instrumentos especiais capazes de reproduzir ou fazer soar as partes desta região. A solução encontrada pelos construtores na época (luthiers) foi simplesmente reconstruir os instrumentos existentes, só que em escala maior, aumentando-lhe o tamanho, mas sem trocar a forma ou a construção desses novos instrumentos.
Verificamos aí que a evolução técnica e artística de um instrumento qualquer estão imprescindivelmente ligada à história da música. Assim, a evolução no número de partes da harmonia trouxe a necessidade de se criar outros instrumentos que desempenhassem satisfatoriamente aquela nova função.
Muitas pedras rolaram até que um instrumento que reunisse as qualidades necessárias para a reprodução dos graves surgisse do meio de muitas tentativas.
Historiadores narram que no ano de 1493 alguns músicos espanhóis, ao visitarem a Itália, ficaram maravilhados ao verem violas tão grandes.
Na Itália, as violas tinham três tamanhos: a viola da gamba aguda, a tenor e a viola baixa. No fim do século XVI, a família chegou ao número de seis membros com a adição do pequeno baixo da Gamba, grande baixo da Gamba e Sub-Baixo da Gamba.
Houve uma considerável experimentação com relação às violas. Algumas chegaram a ter corpos de tamanhos fantásticos, umas outras com vários formatos e tamanhos.  O ancestral mais próximo do Contrabaixo foi o Violone. Esse nome que é freqüentemente encontrado referindo-se ao contrabaixo, originalmente aplicava-se a qualquer dos instrumentos da família das violas, fosse ele grande ou pequeno. No início do século XVII, o Violone tornou-se o nome que designava o maior de todos: a Viola Contrabaixo. Durante mito tempo, assim ele foi chamado e somente após a segunda metade do século XVIII o nome do contrabaixo separou-se do violone.
O famoso compositor J.S. Bach sofreu muito na época por causa da insuficiência dos contrabaixistas do seu tempo. De acordo com registros históricos, até o ano de 1730 não foi encontrada nenhuma referência do instrumento já atuando em Orquestras. A partir da Segunda metade do século XVIII, com sua estrutura praticamente definida, o contrabaixo passou a integrar as mais diferentes formações musicais, como orquestras, Big Bands e pequenos grupos de jazz (ragtime, dixland, Swing, Blues etc…). No final dos anos 40, a amplificação já desempenhava um papel dominante na música popular americana. Amplificadores, PAS, captadores e a guitarra Fender Telecaster eram os elementos principais de uma tendência rumo à música em um volume mais alto.                      
                                
Alguns contrabaixistas – limitados a enormes baixos acústicos – instalaram captadores, usando amplificadores adaptados para esse fim. Outros seguiam o exemplo de Les Paul, ou seja, tocando seqüências de baixos nos bordões das guitarras elétricas. No início dos anos 50, Clarence Leo Fender, perito em eletrônica de rádios e criador da guitarra elétrica que levava seu nome, observou que o contrabaixo acústico apresentava alguns inconvenientes para pequenas formações musicais, como seu tamanho e a sua baixa sonoridade (em comparação com a guitarra elétrica), o que obrigava os contrabaixistas da época a colocarem microfones para uma maior amplificação do instrumento.
Sob este prisma, Leo Fender, em 1951, construiu o primeiro contrabaixo elétrico da história, usado pela primeira vez na banda de Bob Guildemann (blues e rock) tendo como nome à designação Precision Bass.
O legado Fender
Depois de haver inventado, literalmente, a guitarra elétrica com corpo sólido em sua oficina de rádio em 1947, Clarence Leo Fender com seu pequeno time de auxiliares começou a conceber, na primeira metade de 1949, um instrumento entre a guitarra elétrica e o grande contrabaixo acústico utilizado desde então por todos os músicos da época. Não somente Fender como todos os demais baixistas da época achavam o baixo acústico, além de grande e incômodo (em caso de transporte), deficiente em nível de expansão sonora (apesar de tentativa de amplificar seu sinal mediante a utilização de microfones e captadores “especiais”, os resultados obtidos eram sofríveis…).
                                                        
Leo, além de um profissional extremamente competente, estava sempre em contato com músicos na época, integrando-se, portanto, a suas necessidades, entre as quais, a construção de um instrumento que pudesse substituir o acústico gerando ainda uma maior expansão sonora. Leo Fender: – “O primeiro corpo sólido destinado a ser um instrumento musical foi construído em 1943. Nesta época, eu tinha a patente dos sistemas de captadores. Sendo assim, neste período, eu não estava particularmente interessado em sons musicais e sim em captadores! A amplificação de qualquer sinal me fascinava!… O baixo fender foi o próximo passo da evolução após a guitarra elétrica.
Foi uma idéia que se tornou uma obsessão, nesta época, não existiam cordas de contrabaixo ainda. Sendo assim, nos utilizamos cordas específicas para o contrabaixo acústico. Tivemos que cortá-las e adaptá-las em nosso projeto. Revestimos as cordas em uma fina liga de aço permitindo assim que o sinal fosse magnetizado pelo imã do sistema de captadores que tínhamos inventado. Mais tarde, iniciamos a fabricação de cordas específicas para nosso novo instrumento…” •…”O principal objetivo de iniciarmos este projeto foi comodidade! – Queríamos um instrumento que o contrabaixista pudesse obter uma maior sonoridade, que fosse confortável de ser tocado e que coubesse no porta-malas de um carro!… Muitos amigos nossos diziam na época:…” Leo está completamente louco… Ele nunca vai conseguir vender isto. Mas eu tinha uma visão… Estes músicos precisavam de um novo instrumento…E eu iria fazê-lo!…”.
O primeiro modelo foi construído no final dos anos 50. Muitos dos músicos quiseram experimentar o primeiro protótipo. Todos tocavam guitarra e não conseguiram entender como executar este estranho instrumento. Um fato curioso também era que os guitarristas, acostumados com a técnica de execução de seu instrumento, não tinham a mínima idéia de como criar “moldes rítmicos” no contrabaixo elétrico, uma vez que todos nunca “ouviram”, com a devida atenção as estruturas rítmicas criadas nas músicas executadas no período. Não se esqueçam: todos eram guitarristas. Muitos dos baixistas acústicos da época solenemente desprezaram o novo instrumento alegando dificuldade de execução, bem como uma “sonoridade falsa” em comparação ao grande acústico.
As cordas eram afinadas de acordo com os moldes atuais, ou seja, E A D G.  Assim sendo, quando se iniciaram as primeiras incursões do novo instrumento dentro do cenário artístico mundial, ele se limitava simplesmente a repetir o que a guitarra tocava, somente uma oitava abaixo. O grande trunfo deste novo instrumento era, além do tamanho e maior qualidade sonora resultante, o fato de ter um braço mais curto que o similar acústico, além de possuir trastes, o que facilitava sobremaneira a execução do mesmo. Foi desta forma que Leo Fender, em uma chuvosa tarde de dezembro de 1951 batizou seu novo invento:… Sim, um instrumento que seja diferente do acústico. Que possua trastes para uma execução “precisa”… É isto mesmo: Um “Precision Bass”. O resto é história…
Comparado à guitarra, o sentido é inverso: enquanto muitos guitarristas promovem um revival de modelos de 30 anos atrás, os baixistas justamente agora começam a explorar o instrumento de maneira mais ampla e em todos os sentidos, como novas formas de técnicas de execução, em amplificação, na construção de modelos mais avançados e com novos recursos (5, 6, 7, 8, 10,12 e 16 cordas!), bem como no uso de efeitos para incrementar o som do instrumento. E, apesar de todo o progresso, parece que ainda há muito a ser feito!
A transformação do contrabaixo acompanhou a eletrificação das guitarras. Não se poderia eletrificar o baixo acústico, por sua própria mecânica, seu tamanho, sua técnica e dificuldade de transporte. Então, a partir dos anos 50 foram surgindo os modelos elétricos parecidos com os atuais. Foi nos anos 50 que surgiram dois dos modelos clássicos de maior sucesso e muito procurado até hoje: Fender Precision e Jazz Bass. Outras marcas famosas na época eram os Rickenbacker, Hofner, Ephiphone, Gretsche e Gibson; nomes que atravessaram as décadas seguintes, chegando até hoje com razoável sucesso. A marca registrada destes instrumentos é a construção cuidadosa, pesada e forte, propiciando a esses instrumentos um som característico e que marcou época. São instrumentos que refletem muita bem a evolução de muitos estilos ligados a eles. E, por isso, possuem um preciosismo procurado por muitos músicos.
Fundamental na evolução do instrumento foi que, em algum ponto da década de 70, luthiers americanos começaram importantes inovações na construção dos baixos elétricos como a introdução de novos tipos de captadores (eletrônica ativa) desenvolvidos pela Alembic e utilizados por músicos como Stanley Clarke, Larry Grahan e Alphonso Johnson.
Chegamos à era dos instrumentos mais leves, de design arrojado, com construção mais elaborada (na escolha de madeiras e ferragens) e com a parte elétrica bem mais sofisticada, sendo que esta tendência até hoje é uma constante na fabricação dos instrumentos atuais.
Marcas como Ibanez, Yamaha, Steinberger, Aria Pro, Fodera e Zon passaram então a dominar a cena mundial de contrabaixos elétricos.  É óbvio que o contrabaixo sofreu algumas modificações ao longo deste tempo todo, sendo as mais importantes os instrumentos construídos em modulus grafite e fibra de vidro desenvolvida por Ned Steinberger.
Contudo, desde o Precision, a maioria dos baixos quase não tem sofrido modificações eletrônicas que aprimorem o pioneiro trabalho de Leo Fender. Enquanto os amplificadores se tornavam mais eficientes e a invenção de Fender se difundia entre os músicos, o som do Precision, grave e pesado, passou a não corresponder totalmente para alguns contrabaixistas da época; – “Faltam agudos ao Precision” – diziam.
Assim, o próximo passo lógico na evolução do contrabaixo elétrico foi oferecer uma maior resposta às freqüências altas. Dois novos modelos surgiram: o primeiro foi Fender Jazz Bass, que nasceu em 1960. O segundo foi o Rickenbacker 4001, lançado logo depois.  Ambos utilizavam dois captadores em vez de um só, e a idéia era dar ao baixista a opção de criar o seu próprio timbre através da mistura dos dois captadores (um para os graves, outro para os agudos). Não por coincidência, o Jazz Bass e os 4001 possuíam braços mais estreitos que o Precision Bass.
Mas nem o Fender Jazz, nem o Rickenbacker 4001 agradaram completamente. Mesmo não possuindo uma boa resposta para as freqüências altas, oPrecision, pelo menos, tinha um som contínuo e encorpado.
Os baixos com captadores duplos, por contraste, soavam ricos em todas as freqüências, mas tendiam para certa falta de característica e de peso nos timbres médios. Muitos baixistas, entretanto, tiraram proveito desse som, com destaque para Larry Graham (Sly & the Family Stone) e seus “slap’s” com o Jazz Bass e Chris Squire (Yes) com o seu Rickenbacker. Quando a Companhia Alembic começou a construir guitarras e contrabaixos em 1968, seus engenheiros empregaram circuitos ativos que selecionavam ou filtravam certas freqüências antes do sinal partir para o amplificador.
Em meados dos anos 70, as pirotecnias de Stanley Clarke, com seu baixo Alembic, causaram sensação entre os baixistas da época, consolidando a utilização dos circuitos ativos em todo o mundo.
Depois de vender a sua companhia para a CBS, Leo Fender ajudou a desenvolver, no começo da década de 70, outra lenda: o contrabaixo Music Man. Mais tarde, Leo Fender fundou a G &L, cuja estrela da linha de baixos com circuitos ativos foi o interceptor, cheio de graves e bem educado agudos.
Contrabaixos com circuito ativo não necessitam ter mais botões do que o amplificador, mas às vezes as fábricas ficam mais interessadas no visual do que propriamente no aspecto funcional do instrumento. Mas tudo não passa de tentativas de refinar o conceito do baixo elétrico, isto é, do pioneiro Precision. Basta folhearmos qualquer revista estrangeira de música para depararmos com toda sorte de coisas. Dos ousados Steinberger ao Clevinger, um baixo de braço duplo. Também poderemos nos deparar com baixos de 8 cordas. Este instrumento, que possui mais 4 cordas afinadas 2 oitavas acima da afinação normal, foi fabricado em 1963. No entanto, não foi aceito pelos contrabaixistas da época, em virtude de seu peso excessivo, problemas de afinação e braço muito grosso.
Alguns modelos surgiram com razoável aceitação, como os instrumentos fabricados pela B.C. Rich, com um desenho contemporâneo e um braço inteiriço que atravessa o corpo. Outros bons baixos de oito cordas são os fabricados pela Hammer e Kramer. Um novo salto da evolução surgiu com os contrabaixos Kubicki Ex Factor, fabricados por Philip Kubicki em Santa Bárbara, Califórnia. Seu projeto custou 18 meses de trabalho e tudo foi pensado ergometricamente: peso total, centro de gravidade, desenho do corpo, enfim – tudo foi planejado para proporcionar maior comodidade ao contrabaixista. Os circuitos eletrônicos do Ex Factor possuem sete funções separadas, controladas por dois botões e um seletor rotatório. Um outro fator interessante de sua construção é os dois trastes adicionais na corda E (Mi bemol e Ré), abrindo, na época, nova fronteira para os músicos.
O Kubicki Ex Factor pode ser ouvido e admirado nos trabalhos em vídeo do contrabaixista Stuart Hamm, onde são obtidas grandes variedades de sonoridades e timbres, mediante a utilização das técnicas de Slap e Tapping.
Em 1982, através do visionário Joe Zoon, foi criada a Zoon Guitars and Bass. Atualmente, o modelo “State of the Art” é o Zoon Hyperbass fretless, desenvolvido para ser utilizado pelo maior contrabaixista da atualidade: Michael Manring.
Este instrumento excepcional possui dispositivos Hipshot em cada tarracha para reafinação instantânea em qualquer tom, ponte com microafinação em dois níveis de ajuste para até dois tons, além de saída estérea com plug de oito pinos (dois para cada corda) e braço inteiriço feito em grafite e fibra de carbono (não existem tensores – este tipo de braço não sofre oscilações como os demais instrumentos).
Não vamos abordar o modernismo por aqui. Afinal o importante é atestar a trajetória vitoriosa dos contrabaixos na sua essência.
fonte:  Esta matéria foi extraída em parte do livro “The Bass Book – A complete illustrated history off bass guitar’s” – Tony Bacon & Barry Moorhouse, GPI Books Miloler Freeman Inc.

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